segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Entrevista de Daniela Inácio - AEUNL

A Daniela concedeu recentemente entrevista, que se transcreve de seguida, ao site da Associação de Estudantes da Universidade Nova de Lisboa, onde está a tirar o curso de Gestão.







Associação de Estudantes (AE) - Com que idade começaste a nadar?

Daniela Inácio (DI) - A verdade é que antes não gostava muito de nadar, até tinha medo da água e das ondas. Nos primeiros anos era a minha mãe que me obrigava a ir aos treinos, mas quando entrei para a equipa de competição no Belenenses, com 10 anos, comecei a ficar motivada, a fazer amizades, o que ajudou imenso. A partir daí ganhei o gosto pela natação e hoje não me imagino sem nadar.

AE - Quantas vezes é que treinas por semana?

DI - De Segunda a Sexta-feira treino todos os dias à tarde 3 horas. De manhã, dependendo dos horários das aulas, 3 ou 4 vezes. E sábado de manhã também. Só descanso Sábado à tarde e Domingo.

AE - Como consegues conciliar os estudos com a natação de alta competição?

DI – Bem, não fiz todas as cadeiras por isso foi um bocadinho mais fácil. Deixei uma cadeira para trás das que tinha planeado fazer mas foi porque fiz o exame na 1ª fase e tinha acabado de vir da prova em que tinha sido qualificada para os Jogos Olímpicos e o exame de 2ª fase calhava no Sábado no qual tinha outra competição.
Mas foi possível, correu tudo bem. Gostei do ambiente, das pessoas, dos professores e vinha sempre muito motivada para as aulas, porque vinha tão cansada dos treinos e a faculdade era como um mundo à parte, um escape.

AE – Mas o esforço que te é exigido não é só físico, é também muito psicológico. Como fazes para te concentrares nas duas coisas?


DI
- Como nado desde sempre não sei bem o que é não nadar, ou melhor, ter uma tarde livre. Mas gosto assim e “quem corre por gosto não cansa”. Mas é verdade, já houve alturas em que me senti perdida, questionava-me sobre o que estava a fazer, porque estaria a abdicar de tanta coisa, apetecia-me desistir mas depois sabia que me ia arrepender e agora sei que valeu mesmo a pena.
O primeiro semestre foi um choque, estava perdida, não sabia por onde começar nem por onde estudar. Essa foi a maior dificuldade de adaptação.
Tentei ir a casa almoçar e depois ir para o treino à tarde mas vi que era insustentável, não tinha carro, não conseguia estudar, o tempo era muito pouco.
No segundo semestre comecei a perceber como gerir o tempo e como haveria de estudar. O principal é não faltar às aulas e estar com muita atenção, na primeira fila. Sei que se faltar às aulas ou não estiver com atenção, não vou ter tempo para estudar em casa.
Passei a sair das aulas, almoçar por lá e ir directa para o Belenenses onde estudo antes do treino que começa às 17.00. Depois acabo o treino às 20.00, janto e vou dormir porque tenho de dormir bastantes horas para recuperar, senão o rendimento desce significativamente.

AE - Com o tempo tão contado há de certeza muitas restrições que tens de fazer. Quais?

DI - Tenho de abdicar das festas, das saídas à noite, de passar uma tarde com os amigos... Não fui a nenhuma festa da Nova e não fui à minha Viagem de Finalistas. Mas o que perdi compensou aquilo que ganhei. Não me arrependo de nada e posso continuar a abdicar disto porque o que ganhei foi único.
Outra restrição que não diz respeito à falta de tempo é a alimentação que tem de ser mais controlada e pensando nos nutrientes que cada alimento dá. Tenho de optar entre alimentos, pensar no que o meu organismo precisa e incluir suplementos na minha alimentação diária.

AE – Agora em relação aos Jogos Olímpicos nos quais foste estreante. Como foi a experiência?

DI - A minha mãe era nadadora e se fosse só pela Rússia tinha ido aos Jogos Olímpicos mas na altura era União Soviética e havia uma atleta ucraniana que era melhor, por isso não foi. Isso ajudou a que fosse desde sempre um sonho partilhado com a minha mãe. Depois quando consegui a qualificação fiquei muito contente. Eu sabia que era possível mas não sabia ao certo, esforcei-me muito mas podia ter corrido tudo mal.
Quando cheguei, entrei no mundo do desporto. São muitas muitas modalidades, 10 mil atletas num espaço fechado inteiramente dedicado ao desporto onde não pode entrar mais ninguém a não ser atletas, técnicos, treinadores e organização. É o nosso mundo.
O que é incrível é estarmos a almoçar no refeitório, que é quase do tamanho de um campo de futebol, e estarem muitas nacionalidades, muitas culturas na mesma mesa. É muito engraçado e enriquecedor. É dos poucos sítios do mundo onde se encontra uma mistura tão grande de culturas e um contacto entre os países completamente distante dos conflitos internacionais, das divergências. O espírito é espectacular.

AE - E quanto às expectativas, à ansiedade, à pressão. O espírito competitivo não se torna aflitivo?

DI - A tensão e ansiedade são grandes, claro. Três semanas antes comecei a pensar que os treinos deveriam ter um rendimento melhor. Temos aquele peso de ter de correr bem por ser um acontecimento tão importante. Mas por outro lado, entrei com a penúltima vaga por isso as expectativas não eram muito altas. O pior que podia ficar era em 25º nos Jogos Olímpicos, o que não é assim tão mau. Por isso acho que ajudou ir sem muita pressão, sem expectativas muito altas. Com pressão seria muito diferente, muito mais difícil.

AE - Sentiste aquela responsabilidade? Aquele orgulho nacional?

DI - Eu fui representar Portugal e agradeço ao país por me ter dado esta oportunidade mas mais do que isso foi uma conquista pessoal. Penso que se pensarmos muito nisso, que vamos representar um país, que temos uma grande responsabilidade, que se torna negativo, é a tal pressão que não ajuda. Eu sabia que era isso o que ia lá fazer mas tinha de pensar mais em mim, evitava pensar nisso. Não posso dar mais do que dou e do que sou.

AE - Como te adaptaste às diferenças culturais?

DI - Antes de chegar lá pensava bastante nisso e estava com algum medo de não me adaptar mas quando cheguei não senti grandes diferenças. Porque sim, somos todos diferentes culturalmente, temos hábitos diferentes, e uns comem ovos ao pequeno-almoço e outros cereais, mas estamos todos para o mesmo, isso é o que nos une. Temos todos o mesmo objectivo, ser o melhor, dar o melhor.

AE - E quanto à instabilidade que se sentiu com a participação dos atletas portugueses nos Jogos Olímpicos?

DI - Houve comentários que não foram muito positivos mas que foram extremamente exagerados pela imprensa. Foi incorrecto. Preferiram focar-se em coisas sem importância do que nos resultados fantásticos que obtivemos este ano. Houve inúmeros recordes nacionais de que quase não se falou.
Eu não senti essa instabilidade de maneira nenhuma, o ambiente era óptimo e todos os atletas estavam empenhados. Ninguém foi aos Jogos Olímpicos passar férias. Todos sabiam que é uma oportunidade única e ninguém a queria desperdiçar.
Tínhamos um prédio para os portugueses e uma sala de convívio onde o ambiente era extraordinário. Foi aí que senti verdadeiramente o espírito olímpico. Senti-me muito bem!

AE - Quais foram os apoios que te fizeram chegar tão longe?

DI - Foi principalmente dos meus pais que partiu tudo. A minha mãe levava-me todos os dias ao treino às 6.00 e saíamos do treino muito tarde. Toda a família se teve de organizar consoante os meus horários.
O Belenenses, claro, que sempre me deu as condições de que precisei. Nunca me faltou espaço para treinar.
O meu treinador que me orientou e me fez chegar onde cheguei. Estou com ele há 6 anos, é um excelente treinador e sempre que precisava de um treino mais cedo ou mais tarde, ele estava lá.
Os meus colegas que me apoiam sempre e me dão ânimo quando estou em baixo. É mais fácil, ou menos difícil, treinar com uma equipa do que sozinha.
A Federação Portuguesa de Natação que apostou em mim desde o início e que, com o primeiro empurrão e motivação, permitiu que ao longo deste ano ganhasse sempre mais experiência.
Desde o ano passado tenho ainda o patrocínio da Herbalife que me apoiou bastante e o da AquaLoja que me forneceu equipamento de treino. Este ano assinei também um contrato com o restaurante GreenPepper que me permitirá, para além de ser muito saudável, gerir melhor o tempo pois é muito perto da faculdade.

AE - A Universidade apoia-te?

DI - Tive muitas provas internacionais e quando os exames calhavam nas mesmas datas, não havia facilidades. Mas é compreensível. Com tantos alunos nestas condições, a Faculdade não pode abrir excepções para todos. Agora tenho um percurso que me permite algumas facilidades mas antes era só mais uma nadadora.
Depois há uma equipa de natação da Universidade Nova da qual faço parte. Ainda não fui a nenhuma competição mas gostava muito de participar e representar a Universidade.

AE - Quais são as características psicológicas que permitem a alguém ser um bom nadador?

DI - Ser muito persistente, treinar muitas horas, não desistir, ter muita força de vontade e não ir abaixo com o desgaste. Muitos nadadores podem ter muitas capacidades a nível físico, mas se não treinarem o suficiente, chegam longe mas não tão longe como poderiam. E há uma altura em que fisicamente se estagna e para evoluir é preciso um esforço psicológico enorme, superar-se constantemente. É uma luta.

AE - E quais são os teus objectivos para o futuro?

DI - O grande objectivo sempre foi ir aos Jogos Olímpicos e por isso, quando o concretizei, fiquei como que desamparada. Depois disto qual poderia ser o meu próximo objectivo?
Eu gosto imenso de nadar, não estou a pensar desisitir. Mas penso que os meus objectivos se vão virar um pouco mais para os estudos. Talvez este ano ainda não, vou aproveitar para treinar porque estou a fazer só metade das cadeiras.
Mas não quero fazer uma carreira olímpica, ser nadadora profissional. Não me imagino daqui a 20 anos a continuar a treinar insistentemente. E a carreira de natação acaba muito cedo, aos 30 anos, o que me assusta.
Outro objectivo quando acabar a faculdade e tiver menor carga de treinos, é aperfeiçoar o russo, é a minha maior falha.

AE - E qual é a sensação de saberes que vais ficar para a história? De procurar o teu nome no Google e aparecerem imensas notícias? De seres de repente reconhecida?

DI - O meu nome vai ficar escrito, é verdade, mas continuo exactamente a mesma. Não me imagino nada como vedeta. Na minha rotina não senti nenhuma diferença a não ser o facto de ter esta entrevista!

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Numa iniciativa da UNL, a Daniela Inácio e o seu colega Olímpico Gustavo Lima, foram convidados para a cerimónia de abertura do curso de pós-graduação em "International Management". Transcreve-se de seguida parte da notícia.

"Atletas olímpicos partilham experiência com os alunos do CEMS MIM. A Faculdade de Economia da Nova deu as boas vindas aos alunos da 1ª edição do CEMS MIM - Masters in International Management .





Os atletas olímpicos Gustavo Lima e Daniela Inácio foram convidados a partilhar as suas experiências com os alunos aceites no CEMS MIM - Masters in International Management

O objectivo deste evento, para além de congratular os alunos pela sua entrada neste programa de mestrado internacional após um exigente processo de selecção, foi motivá-los a percorrer com energia e determinação o caminho que têm pela frente. Para ilustrar este último aspecto a Faculdade convidou dois dos atletas olímpicos de Pequim – Daniela Inácio e Gustavo Lima – que partilharam as suas experiências de empenho, espírito de sacrifício, trabalho, disciplina e ambição para atingir objectivos."

8 comentários:

Anónimo disse...

sem objectivos é um problema.

Anónimo disse...

sem objectivos é um problema mas há sempre objectivos que se criam ao conseguir atingir os objectivos que sempre se tiveram por se pensar ser o máximo que se pode atingir. Só que quando se atinge esse "máximo" há sempre mais alguma coisa a atingir nem que seja superar o já atingido.

Anónimo disse...

Na natação os objectivos são sempre muito claros.
Melhorar:
- técnica
- resistência
- velocidade
- força
- concentração
- persistência
- espírito de grupo
etc.
Se as coisas ocorrerem naturalmente, sem lesões ou doenças, alcança-se o objectivo final -- MELHORES TEMPOS --

Anónimo disse...

muito claros?? melhorar o espírito de equipa é claro? lol a concentração é claro?? como é q uma variável q n é quantificável pode ser clara?

Anónimo disse...

A um tempo um atleta teve uma iniciativa de criar objectivos, com uns inqueritos e até foi giro para cada um se situar e perceber o que que realmente quer. E para mim deu resultado.
Falem com ele penso que ja é licenciado agora deve saber mais ainda.

Anónimo disse...

Daniela, objectivos tem que ser uma medalha em 2012. Com a Cruz de Cristo ao peito!

Anónimo disse...

sim, a cruz de cristo so faz é merda a natação!

Anónimo disse...

Ainda a propósito de treino e dos objectivos.O treinador deve:
- Analisar os factores que explicam o comportamento humano em diferentes contextos de performance
- Analisar criticamente o impacto da actividade desportiva nos processos psicológicos
- Formular juízos críticos sobre processos de avaliação psicológica em contexto desportivo
- Conhecer e saber aplicar técnicas e estratégias psicológicas básicas de optimização do rendimento e de modificação do comportamento
- Saber planear, implementar e avaliar programas de intervenção para o desenvolvimento de competências psicológicas básicas em contextos performativos
- Desenvolver competências de trabalho em equipa
Este trabalho é cientifico e portanto pode ser medido.
No dia-a-dia é possível trabalhar os diversos factores de treino e registar progressos mensuráveis e que se traduzem em melhores performances.
A psicologia do desporto faz este trabalho há muito tempo!
Nem só de qualidades físicas vive o desporto.
Os resultados são a consequência directa do que acontece na interacção pedagógica.
Os objectivos alcançam-se com Perseverança e Empenho: quantidade de tempo que o atleta permanece ocupado e concentrado, focado activamente na tarefa.E isto em todos os momentos do treino. E consequentemente na competição o trabalho dará frutos.
FQ